Um tema polêmico, principalmente para os “investidores” sardinha, que querem ficar milionário apostando em um “jogo” que nem é jogo. Mas vamos contextualizar por que não existe um jogo Play-To-Earn que possa ser sustentável.

Oferta e demanda

Quando se analisa a grande maioria dos jogos Play-To-Earn, estamos falando de modelos em que o jogador faz um investimento inicial para compra de NFTs de vários tipos diferentes, sejam cartas, carrinhos, “pokémons”, naves, etc., etc., etc. Alguns até possuem uma estrutura tecnológica bacana, como foi o caso do Axie Infinity, porém todos eles tem a mesma premissa: moedas sem um total supply definido, sendo possível gerar novas moedas “a vontade” e um token de governança para especuladores e investidores que de fato vão “gerar o valor” do negócio. Vamos ser honestos, nenhum investidor vai aportar milhões de Dólares para prover liquidez sem um plano bem estruturado de saída previamente negociado com os desenvolvedores. Por mais que esses termos estejam em Smart Contract, normalmente um investidor vai comprar esses tokens em whitelist ou ofertas privadas com valores muito baixos, para gerar um volume inicial de negociações e, assim, criar uma rasa impressão de valorização do projeto. Mas a grande maioria dos Venture Capitals e fundos de cripto retiram o investimento pouco tempo depois de uma oferta pública ou ICO, existem até serviços “garantidores”, que vão segurar a massividade de tokens e ir liberando aos poucos para essas “grandes baleias”, a fim de não derreter logo de cara e criar um efeito cascata de stop loss.

Além do problema que temos com relação a investimentos nas primeiras rodadas, em todos os projeto que vi até hoje (e em 2021 entrei a fundo no tema, chegando a ter investimentos em vários jogos), existe a necessidade frequente de novos jogadores para cobrir os custos de pagamentos dos mais antigos, muito semelhante a um esquema Ponzi. Caso o projeto não consiga suprir a demanda por novos jogadores, o token começa a desvalorizar, o que exige dos administradores do jogo a injeção de liquidez a fim de não evaporar. No caso do Axie Infility, o que manteve o projeto de pé por tanto tempo foi o fato do marketplace de NFTs ser negociado em ETH, porém não existia um custo efetivo por parte da empresa nas transações, já que utilizavam uma Sidechain chamada Ronin e as taxas cobradas na compra ou transferência de certa forma pagavam a operação e os saques, que podiam ser controlados apenas liberando ou travando as operações de Bridge.

Sidechain

Para que não esta familiarizado com o termo, Sidechains são redes secundárias, criadas à partir da tecnologia consolidada de uma rede maior. No caso, a Ronin foi implementada com base da Mainnet Ethereum. Por ser proprietário da rede, você fica responsável por sua segurança e configuração, não existem taxas para transferências e o único custo efetivo é para manter os Full Nodes da rede. Foi aí que o Axie errou rude, a rede Ronin não era aberta a mineração e os Nodes validadores da rede eram apenas 9. O sistema foi feito dessa forma para que agentes externos aos interesses da empresa não obtivessem lucro na mineração. Portanto apenas 9 Nodes realizavam as validações e, consequentemente, recebiam a recompensa da rede, porém, para validar um transação, bastava apenas 5 Nodes.

Foi então que, assumindo o controle de 5 Nodes, um Hacker conseguiu realizar um saque da rede de US$625 milhões, vou deixar algumas matérias sobre:

Axie Infinity: Rede Ronin é invadida e perde US$ 625 milhões

Rede de Axie Infinity sofre maior roubo de criptomoedas da história

Sem uso de Sidechains, existem custos operacionais que reduzem drasticamente a receita do game, consequentemente pagar Play-to-Earn fica a cargo de especulação do Token.

Poderia existir modelo possível ?

Durante meses conversei com várias pessoas do mundo cripto e a conclusão que chego é que a única forma sustentável para o modelo seria um híbrido com NFTs colecionáveis, gerando um mercado onde a taxa de transação seria utilizada como forma de remuneração, sistemas como loteria e lootbox também poderiam complementar a volumetria do pote, em uma analogia a como funciona os cassinos de Las Vegas, com taxa fixa de rentabilidade. Ainda no meu ponto de vista, sem a existência de um token do jogo em si, seria necessário utilizar um que tivesse outros tipos de aplicação como BNB ou até mesmo o próprio ETH, pois aí o risco de pump and dump é improvável. Porém, como o custo médio de uma transação ou mint hoje está por volta de $5 a $10, fica inviável manter microtransações nessas redes, principalmente quando falamos de jogos mobile, com baixas margens de ROI. Se eu fosse sugerir um token que me parece interessante para montar um jogos, seria o BUSD, pela paridade com o Dólar e porque pertence a uma grande Exchange mundial, que é a Binance, com alto nível de liquidez, fica bem mais simples de calcular pois não existem variações abruptas nos níveis das altcoins convencionais.

Uma possibilidade para tornar um Sidechain mais segura seria utilizar os próprios jogadores como mineradores, embutindo no software do game algoritmos de mineração simples. No caso, o uso do Ethereum não seria possível, já que o EtHash (algoritmo utilizado na mineração de Ethereum) requer um cabeçalho na casa de alguns GB de memória RAM e, pra piorar, o ETH está passando para o modelo de Proof Of Stake. Portanto seria necessário um modelo de Blockchain mais rudimentar, com algoritmos mais leves, como SHA256 do Bitcoin e, ao mesmo tempo, com suporte a Smart Contracts e suporte Bridge nativo ao token oficial do game, mas hoje simplesmente não existe nenhuma Blockchain desenhada nessas especificações, pelo menos não que eu conheça. Para finalizar, mas não menos importante, seriam necessários mecanismos sólidos anti-fraude no sistema Bridge da rede, para evitar roubos semelhantes ao que ocorreu na rede Ronin. Sem essa infra estrutura, em minha opinião Play-To-Earn não se sustenta e não é viável financeiramente. Todo projeto usando como base os conceitos da primeira leva de “jogos” desse estilo são meramente especulativos ou fraudes.