Hoje a gente vai falar de Sidechains, Layer2 e Altcoins. Para quem não viu o post anterior sobre Network, eu vou deixar fixado aqui em baixo.
Quando a gente fala de Bitcoins, existe a rede do Bitcoin e a moeda existe dentro dessa rede. Sem a rede, a blockchain em si só serve como um banco de dados, a estrutura é um pouco diferente da de um banco de dados tradicional, mas ela serve basicamente para armazenar informações. O que torna a rede segura são os validadores, os nodes de mineração, no caso do Proof of Work. Como a gente tem várias moedas derivadas do Bitcoin, deram o nome de altcoins a esses ativos, que são alternativas ao Bitcoins. Por isso que a gente fala que “Bitcoin é Bitcoin” e qualquer outra variação disso são altcoins. A gente tem também outros tipos de moedas, como as stablecoins, que já são outro nível de altcoins, mas eu falo melhor sobre elas outra hora, porque é um tema bem polêmico.
Sobre o tema de hoje, que tem tanta terminologia, tanto nome diferente, alguns nomes complicados e tal… O que vem a ser uma sidechain e o que vem a ser uma Layer2? Se você entende conceito de network e que a maioria dos projetos de cripto são projetos open source, sabe que tem a possibilidade de ir no Github, pegar o código inteiro do Bitcoin, baixar ele, renomear e subir uma rede. Por exemplo, o Dogecoin, que é uma altcoin meme, é uma piada, eles pegaram o código do Ethereum, renomearam a moeda da rede como Doge, subiram a rede lá e é isso, entendeu? Tem várias moedas que são nesse estilo, que são os meme coins da vida, os spams. E a gente precisa saber diferenciar o que de fato é uma rede sólida, uma solução de Layer2 e uma sidechain, para entender se vale à pena investir numa moeda ou não. Eu sempre falo nos meus posts e vídeos que eu não faço investimentos em cripto, eu não tenho investimento em cripto, eu minero criptomoedas e entender esse ecossistema é super importante para eu definir qual moeda minerar, se vale à pena transformar aquela moeda que eu estou minerando em outra moeda mais estável e por aí vai.
Em 2014 a gente teve o nascimento do Ethereum, que foi uma grande revolução com relação às estruturas de Smart Contracts e EVM [Ethereum Virtual Machine], que não existiam originalmente dentro do Bitcoin. O Bitcoin nasceu para ser uma solução simples de transferência monetária, isso tem quer ser sempre frisado: a essência do Bitcoin é simples, é eu poder transferir um “dinheiro”, que seria o Bitcoin, que é a moeda da rede, entre duas pontas, P2P, sem ter duplo gasto. Então a gente consegue, através de blockchain, Proof of Work e validações dos nodes, garantir que não vai acontecer duas vezes a transferência do mesmo saldo, que é uma propriedade que a gente só tinha anteriormente em serviços fechados, como os dos bancos. E, a partir de 2014, talvez um pouco antes, várias network foram criadas a partir do Bitcoin, a gente tem o Litecoin, o Bitcoin Cash, o Bitcoin Gold e vários outros derivados dessa rede. Depois que nasceu o Ethereum, a gente tem, por exemplo, a Polygon, a Immutable X, a BNB, a rede Ronin do Axie Infinity e várias outras derivadas do Ethereum. E depois foram surgindo várias outras tecnologias de blockchain, que de fato têm o código implementado do zero, priorizando alguma alternativa e tal.
Mas o que é a tal da sidechain? A Ethereum, que tem a maior quantidade de sidechains hoje no mundo, implementou o conceito de EVM e Smart Contracts dentro da blockchain e, consequentemente, trouxe para dentro da estrutura da rede muito mais transações do que a gente via no mercado do Bitcoin. Toda interação que você faz no contrato, seja consolidar esse contrato na blockchain, realizar um mint de supply, fazer uma transferência, isso tudo vai no mesmo bolo que uma transferência simples de Ether [a moeda corrente da rede Ethereum]. Então, o que acabou acontecendo com a rede Ethereum? Hoje, ainda na versão 1.0, ela ainda roda em Proof of Work, então precisa de mineração, é uma blockchain bem semelhante à do Bitcoin, tirando algumas pequenas mudanças para tentar ganhar um pouco mais de escala, só que tem muito mais transações acontecendo dentro da rede Ethereum. A quantidade de dados que trafegam ali é muito maior que na rede do Bitcoin. Com isso a gente começou a ver, ao longo do tempo e à medida com que o Ethereum foi ganhando tração e volume, a rede ficando lenta e cara, porque se acumulam muitas transações para serem validadas. A gente tem um problema muito grande nessa arquitetura de blockchains monolíticas, que fazem uma criação de blocos sequenciais. Hoje, e eu gosto muito de frisar o “hoje”, porque está para acontecer uma migração para versão 2.0, então hoje a Ethereum segue os mesmos princípios de descentralização e segurança do Bitcoin. Com o tempo, o Vitalik Buterin, que é o criador do Ethereum, resolveu priorizar resolver o problema da escala dentro da rede. Eu não vou entrar muito no tema, mas eu vou deixar os posts onde eu falo sobre a migração do Ethereum 2.0, e explico as desvantagens nessa migração:
Falando de sidechains, a gente tem as soluções de camada 2. O que vem a ser as soluções camada 2, Layer2? Pelo fato do Ethereum ser uma rede congestionada hoje em dia (outros altcoins também têm esse problema) por causa do volume de transação e porque os contratos inteligentes precisam de um poder computacional muito grande, o custo das transações aumentou. Na prática, o aumento do custo é positivo para rede, porque você torna menos provável que alguém compre uma quantidade muito grande de Ether e tome conta da rede quando ela migrar pro formato PoS, mas para o usuário comum, que só quer fazer uma transferência de Ether, fica muito cara essa rede. Então a ideia da Layer2, das sidechains [uma Layer2 não obrigatoriamente é uma sidechain, mas toda sidechain é uma Layer2, eu já vou explicar qual a diferença de uma e de outra], mas qual o objetivo da criação dessas redes secundárias, que não são a Mainnet, mas que têm uma conexão com essa rede principal ou, pelo menos, um suporte possível de implementação? Imagine o seguinte: eu posso baixar todo o código fonte do Ethereum, montar a minha própria sidechain, inclusive a gente fez isso lá na Uzmi Games, a gente fez a Uzmi Network, e aí, como eu sou o proprietário dessa sidechain, todas as transações que acontecem dentro da rede “sai de graça”. O custo que eu tenho para manter a sidechain é basicamente com os servidores que vão comportar essa rede, que tem que ter um HD muito grande, e comportar os nós validadores do full node. Quando você vai configurar a sidechain, pode configurar PoW ou PoS, você tem essa opção, o ponto é que, para você liberar o PoW e ter pessoas interessadas em minerais dentro da sua rede, você tem que oferecer alguma recompensa que valha alguma coisa. As pessoas mineram Ethereum porque dá pra pegar o Ether, ir numa Exchange e trocar. Se você tem uma sidechain e não tem minerador, você tem que ter os seus próprios mineradores, por isso a maioria das sidechains centralizadas preferem configurar o PoS e colocar as próprias máquinas da empresa para fazerem a validação. Isso, no meu ponto de vista, é um grande erro, porque pede a descentralização, você está centralizando a validação dos blocos, então somente as máquinas que você escolher dentro da rede é que vão ter autoridade para validar aqueles blocos.
E por que eu falei que toda sidechain é uma Layer2, mas nem toda Layer2 é uma sidechain? O funcionamento de uma sidechain depende do funcionamento da rede principal. Eu posso montar uma Layer2, que roda totalmente independente Mainnet, para um fim específico. Por exemplo, eu quero fazer o controle de itens dentro de um jogo em uma blockchain, eu vou fazer uma Layer2 isolada, sem problema nenhum. Já uma sidechain precisa utilizar mecanismos para, de tempos em tempos, anexar essas informações dentro da Mainnet. E como é que é feito esse processo? Por meio de rollups. Vamos imaginar o seguinte: você quer comprar um bolo, um pedaço de bolo é caro, um bolo inteiro é muito, então você se junta com várias pessoas e divide os custos para compra um bolo inteiro. Essa é a proposta da sidechain, reduzir os custos de fazer uma transferência em Ethereum. Você reduz os custos por que as informações das transferências ficam nessa segunda camada e a primeira camada só consolida as informações que a sidechain envia para ela via rollups. Só que tem um problema, você precisa confiar que essa sidechain é autêntica e confiável. A Polygon, por exemplo, é uma sidechain do Ethereum, você transaciona dentro dela, paga muito mais barato nas taxas e essas transações são consolidadas dentro Mainnet. Você usa a rede principal para consolidar as informações, e existe todo um algoritmo para verificar a integridade daqueles dados que estão sendo enviados, mas quem armazena e processa de fato essas informações é a sidechain. Já a Layer2 pode ser qualquer tipo de solução que utilize a mesma tecnologia da blockchain, total ou parcialmente. Por exemplo, os DeFi, que geralmente são classificadas como aplicações de Layer2 porque usam Smart Contracts para funcionar. Outro exemplo é o envio de mensagem via carteira, com o protocolo Whisper, que é uma solução de segunda camada. Ethereum não é só o Ether, não é só a blockchain, é todo o ecossistema: os Smart Contracts, a EVM, o Solidity, a Network, a Mainnet, os nós validadores, os mineradores, isso tudo faz parte de um ecossistema. É por isso que a gente fala “universo cripto”, porque não é só uma tecnologia de blockchain, que tem um papel até relativamente simples nesse processo. A blockchain não é nada sem os validadores, a blockchain não é nada sem a rede, a blockchain não é nada se não tiver o protocolo de comunicação e por aí vai. É um ecossistema de verdade.
E por que é importante você entender isso? Quando você vai comprar um Axie Infinity, você precisa passar os ativos da sua Metamask para a rede Ronin, o que você está fazendo, na prática, é mover os seus Ether para uma carteira da Mavis, que é a proprietária da rede Ronin, e aí, dentro da Layer2, você vai receber um valor que se equipara aos Ether que você mandou. Então, quando você faz a transferência, a Mavis fica com o seu Ether e gera um “Ethereum fake” dentro da rede dela e, só através daqueles “Ethereum fake” é que você vai conseguir comprar os Axies. E onde que mora o problema dessa história, porque, obviamente, tem um problema nessa história? A rede Ronin foi invadida duas vezes. O próprio Vitalik Buterin fala que o maior problema de cross-chains são as bridges, inclusive tem um post explicando melhor sobre essas pontes:
E aí é onde mora o maior ponto de falha: de um lado você tem um ativo, que é o Ether, dentro da Mainnet da Ethereum, do outro lado você tem um ativo que não vale nada, que é meramente representativo, o “Ethereum fake” da rede Ronin é especulativo, ele só existe para você conseguir comprar os Axies, que são NFTs plugados dentro da rede Ronin e que você não consegue comprar de outra forma, obrigatoriamente tem que comprar dentro da rede Ronin. Mas o que acontece se essa ponte tem uma falha de segurança? Quem invadir essa ponte pode se apropriar dos Ether que estão na Mainnet, que foi o que aconteceu quando a rede Ronin foi invadida. Eu não olhei a fundo, então sei exatamente como foi, mas os hackers conseguiram pegar os Ether que estavam na carteira da bridge e passaram para outras carteiras. Foram 600 milhões de dólares que os caras roubaram. Mas não tem como fazer nada? Tecnicamente, não. Existem outras formas de se “correr atrás” desse dinheiro, porque em algum momento vão ter que “sacar esse dinheiro”, transformar esses Ether numa moeda FIAT via Exchange, e aí as Exchanges vão conseguir mapear, dentro da blockchain, aquela carteira. Só que, pelo que eu fiquei sabendo, como se não desse para a história ficar pior, parece que os hackers que invadiram o Axie Infinity ainda estão livres. Como o volume de dinheiro era muito alto, 600 milhões de dólares, o FBI começou a monitorar as carteiras e descobriu que estas estavam sacando esse dinheiro numa Exchange da Coréia do Norte e não tem o que fazer, por estar dentro de um regime comunista, isolado, em um país soberano, que tem suas próprias leis. Parece que a Sky Mavis vai reembolsar o dinheiro das pessoas, mas a Binance teve colocar uma grana também, para o Axie não falir.
Olha só que interessante, o Axie Infinity foi tão grande entre 2020 e 2021, que ele tinha a Layer2 mais movimentada do ecossistema Ethereum, o volume de transações por causa do Axie Infinity era gigantesco. Uma única aplicação, um jogo simples, produzia tantas transferências diárias na rede Ethereum que a rede ficou cara, muito cara. Eu lembro que cheguei a pagar taxas de $50 para uma transferência dentro da rede, por causa do volume de coisas que tinha rolando dentro da rede Ronin. Por isso que eles tinham 600 milhões de dólares dentro de uma bridge. Os tokens do Axie Infinity também eram mintados dentro da rede Ethereum. O AXS e o SLP, que são os tokens do Axie Infinity, são um ERC20 dentro da rede Ethereum, é uma doideira. Mas por que precisa de toda essa gambiarra para poder funcionar? Porque quando você fala de um jogo, que todo dia tem batalhas e itens que passam de uma mão para outro, se você quer armazenar tudo isso dentro de uma blockchain, fica inviável financeiramente fazer isso dentro da Mainnet, porque cada operação vai custar caro. Então essas soluções de Layer2 são uma excelente alternativa para você manter tudo em blockchain com um custo reduzido. Se você faz uma sidechain, o custo é bem pequeno, vai ser só o custo do rollup para mandar milhares de transações de uma vez. Mas quando você cria uma solução onde você tema sua própria blockchain, por mais que a gente esteja falando da tecnologia Ethereum, se ela for mal preparada, ela se torna insegura, centralizada, suscetível a falhas. E, iguais ao Axie, a gente já viu vários outros projetos.
O Ethereum 2.0 tem uma proposta para tentar resolver, em partes, essa questão, usando shards, criando suas próprias sidechains internas e barateando do custo da operação. Quando a gente fala em baratear os custos da operação, baratear o custo de transferência, não necessariamente a gente está falando de reduzir o custo do Ether, a gente está falando que a taxa de transferência vai ficar mais barata. Mas, se acontecer algum tipo de problema na migração, no “The Merge”, o preço da moeda pode cair muito e, com o Proof of Stake, alguém com muito dinheiro pode comprar muito Ether e controlar a rede. Se vocês procurarem sobre o tema, vão ver que existe um protocolo de DeFi chamado Lido que representava, até pouco tempo atrás, mais de 50% do valor em stake da rede Beacon, que é a rede do Ethereum 2.0. Perceba, a gente tem um único protocolo DeFi com mais de 50% da rede. Qual foi a ideia do Lido? Precisa de 32 Ether para poder fazer um full node de stake, mas você não tem esse tanto, então vamos fazer o seguinte: você me manda o que você tiver, a gente vai juntar aqui uma galera, quando der 32 Ether, a gente monta um full node, e todo o dinheiro que a gente receber desse stake a gente paga proporcional a quanto você tem aqui dentro da rede Lido. E aí começou uma onda de pessoas indo para esse serviço DeFi da Lido, montando vários full nods, até chegar ao ponto em que mais de 50% da rede é controlada por uma entidade. Quando você move o Ether para o Lido, ele te dá um token para, no futuro, resgatar esse Ether, se você quiser, mas o Ether está em posse do Lido. Olha o quanto isso é perigoso! A gente está falando que, se a migração do Ethereum 2.0 acontecer hoje, uma DeFi tem mais de 50% da rede, isso é muito perigoso e isso pode piorar lá na frente.
E eu não sei muito bem o que vai acontecer com essas Layer2 a partir do momento que fizerem essa migração para o Ethereum 2.0, porque acaba que elas ficam meio sem necessidade de existir. A partir do momento que a gente tem 1024 shards e a rede reduzindo o custo operacional, você não precisa de uma Layer2. Aí eu não sei qual o planejamento dessas Layer2, se ainda vai continuar existindo esse conceito de criar uma blockchain separada para redução de custos, tem que ver para quanto vão cair essas taxas de transação. Eu acredito que, para casos extremos como jogos, ainda vão existir essas soluções de segunda camada, porque o custo de transacionar tudo via blockchain ficaria impossível de ser pago, essa conta não fecharia nunca, e aí a gente vai ter que utilizar algum tipo de solução como essa. Mas para casos mais esporádicos, a utilização de redes de Layer2 provavelmente vai acabar.
O conteúdo desse post é baseado no vídeo abaixo: