Tive o trabalho de ler o Projeto de Lei 4401/2021 para regulamentação de prestadoras de serviço de ativos digitais e essa é minha opinião sobre o projeto.

Autorização de funcionamento

No Art. 2 o projeto temos que “as prestadoras de serviços de ativos virtuais somente poderão funcionar no País mediante prévia autorização de órgão ou de entidade da administração pública federal a ser indicada em ato do Poder Executivo.” De verdade, eu custo a acreditar que a administração pública tem pessoas capacitadas de fato no tema de cripto ativos para definir quem pode ou não operar no Brasil. O ecossistema de criptoativos possui um nível de complexidade tão grande que será necessária a criação de uma Autarquia entre sociedade civil e Estado, em que irão reinar os interesses pessoais. Honestamente, por que empresas brasileira aceitariam de bom grado empresas estrangeiras concorrentes com vantagens competitivas anos luz à frente delas operando em mercado nacional? Na boa, esse tipo de entidade vai acabar igual a várias outras que temos no Brasil: um grande balcão de negócios, que beneficia somente quem faz parte do “grupinho”. Isso tem mais cara de oligopólio do que regulamentação. Nenhuma entidade ou empresa trabalha pelo bem coletivo, vamos ser realistas, empresas trabalham por seus interesses.

Bitcoin oficialmente é uma moeda estrangeira

No Art. 3. I é dito que não são considerados parte da regulamentação “I – moeda nacional e moedas estrangeiras”. Como El Salvador e outros países adotaram oficialmente o Bitcoin como moeda oficial, então, na minha interpretação, serviços digitais em Bitcoin não deveriam ser afetados por esse projeto de lei. Porém, como bem sabemos, a interpretação do judiciário brasileiro vai além do que esta escrito no papel, logo provavelmente essa parte vai ser ignorada, gerando jurisprudências, doutrinas, súmulas com entendimento contrário, atendendo, obviamente, aos interesses de alguém. E, não satisfeitos, ainda complementaram colocando que “competirá ao órgão ou à entidade da administração pública federal indicada em ato do Poder Executivo estabelecer quais serão os ativos financeiros regulados, para fins desta Lei.”, então já está implícito que Bitcoin alguma hora vai ser indicado pela entidade regulamentadora.

Defesa do Consumidor

O Art. 4. IV define que a prestação de serviços deve observar as diretrizes legais de proteção e defesa do consumidor. Logo, na minha interpretação, se aplica o Código de Defesa do Consumidor e vem o questionamento: como fica o Direito de arrependimento? Teremos processos de “investidores” solicitando reembolso após uma operação mal sucedida? Sete dias no mundo cripto é uma eternidade. E como as Exchanges vão tratar sobre o tema? Vão ter que segurar saques por sete dias, até o término do prazo do direito de arrependimento? Acho um puta tiro no pé.

Fraude” Art. 171-A

Particularmente eu acho desnecessário reforçar o artigo de estelionato do Código Penal, pois já é uma tipificação prevista, assim com acredito que interpretar lavagem de dinheiro, evasão de dividas, formação de quadrilha, crimes contra o sistema financeiro nacional, etc. especificamente com uso de criptoativos não faz nenhum diferença efetiva, pois já temos esses crimes devidamente tipificados. O meio com o qual o crime foi praticado nesse caso não faz diferença, no meu ponto de vista. Exemplo, faz alguma diferença matar uma pessoa a facada ou com um martelo? (Não quis comparar com arma de fogo, por aí teria provavelmente o agravante de porte da arma de fogo.) Na prática, a ferramenta utilizada para praticar o crime não altera o tipo legal ou requer adicionais, porém entendo que estão tentando “dar exemplo” depois dos crimes praticados pelo Faraó do Bitcoin, aumentando a pena para crimes praticados com uso de criptomoedas.

Conclusão

Honestamente eu não acredito que criar uma entidade que seleciona quem pode ou não operar no Brasil tenha alguma vantagem, pois não resolve o problema real. Quem deve sofrer qualquer tipo de sansão são as empresas que provém liquidez para operações consideradas ilegais, neste caso, bancos, que são regulamentados por outra entidade e tem um poder político enorme. Essa proposta, a meu ver, não tem como objetivo resolver o problema e sim beneficiar um grupo de empresas que terão influência para vetar a operação de prestadores de serviços de criptomoedas que podem fornecer serviços competitivos comparados aos fornecidos por empresas brasileiras.   

Eu sou extremamente contra a possibilidade de empresas civis participarem de autarquias regulamentadoras, já que interesses privados vão ser adicionados à entidade e isso é conflito de interesse.