Recentemente o Procon SP respondeu à pergunta de um internauta relacionada ao direito de arrependimento, previsto do Código de Defesa do Consumidor, no caso de NFTs. Vamos ao entendimento e a real viabilidade dessa afirmativa.

Resposta do Procon SP sobre arrependimento na compra de NFT

O que fala o CDC

De fato consta no Código de Defensa do Consumidor o direito de arrependimento, em que qualquer cidadão pode, em até 7 dias, devolver uma compra que foi realizada fora de um estabelecimento comercial, portanto incluindo compras online. Mas perceba uma coisa, estamos falando de lojas brasileiras, que possuam um CNPJ no Brasil e, portanto, têm obrigação de seguir as leis brasileiras. Em casos como do AliExpress, entre outros, não se aplica essa legislação, visto que a sede da empresa não está em solo tupiniquim.

Portanto, em teoria, é possível solicitar reembolso caso a empresa vendedora dessa NFT seja brasileira ou tenha sede no Brasil. Agora vamos sair do cenário hipotético e falar a realidade dos fatos.

Inviabilidade operacional

Quem entende minimamente do universo cripto sabe que todas as transferências são imutáveis e irrevogáveis. Depois de transferir um saldo ou uma NFT é impossível reverter o processo, principalmente em uma rede Mainnet, como Ethereum. Portanto, uma empresa brasileira que venda uma NFT como um Bored Ape, que pode custar milhões de Reais, precisaria manter o ativo em sua propriedade por 7 dias, além de poder entrar no cano, de acordo legislação brasileira, no caso de precisar reembolsar o comprador, tornando inviável esse tipo de operação, principalmente em se falando de NFTs com alto valor agregado.

Outro ponto importante dessa discussão é que, em teoria, se a empresa que está vendendo o ativo não honrar com o CDC, o criador do NFT seria “solidário” à ação, o que quer dizer que ele poderia ser acionado judicialmente como corresponsável. Mas estamos falando de uma cenário em que qualquer pessoa na Terra pode criar um Smart Contract, criar sua própria coleção de NFTs e disponibilizá-la na rede para mint e venda, até mesmo de forma anônima. Ainda que essa pessoa seja brasileira ou tenha endereço no Brasil, fica praticamente impossível caracterizar de fato a wallet criadora do Smart Contract com uma pessoa física ou jurídica, a não ser que seja explícito, como o caso das NFTs da Reserva, por exemplo.

Vai reclamar para quem?

Em tese, abrir um processo para ressarcimento previsto no CDC exige intimar a empresa ou pessoa física. Se você comprou uma NFT em uma Dex ou Exchange estrangeira ou, ainda, realizou o mint direto no site do criador, comprou de terceiro por P2P ou coisa do tipo, você vai intimar quem, amigo?

Vai mandar oficio para a Binance? Vai xingar muito no Twitter? Vai obrigar a justiça a procurar um culpado? Não sei se você sabe, mas quem tem a responsabilidade de informar o endereço de intimação é quem abre o processo. Mesmo na pandemia, com oficiais de justiça mandando intimação por WhatsApp, teoricamente sua ação não tem possibilidade de ser julgada sem o direito a ampla defesa da parte que está sendo acusada (novamente, em teoria – já vi muita coisa nessa vida).

Minha opinião honesta

CDC para cripto é uma piada, que mais atrapalha o trabalho das Exchanges e serviços sediadas no Brasil do que ajuda. Nenhum serviço BR vai colocar o dela na reta para transacionar NFTs de alto valor com essa pica dos 7 dias de arrependimento. Logo, vamos ter serviços capengas, perdendo em volume e valores para Exchange e serviços estrangeiros. As poucas empresa que de fato vão criar NFTs no Brasil tem uma chance próxima a zero de serem listadas em Exchanges maiores, já que ninguém que opera realmente descentralizado vai listar um “ativo” com essas regulações absurdas, ou falta delas, como achar melhor. Essa legislação funcionava nos anos 80. Em pleno ano de 2022 a realidade é completamente diferente e se adaptar a essa nova realidade é algo que os legisladores brasileiros estão anos luz atrasados.