Hoje a gente vai falar sobre desenvolvedores: como contratar bons devs para sua empresa e como retê-los.

Eu estou no mercado programação a mais de 15 anos e já contratei diversos programadores: alguns muito bons, excelentes; alguns geniais, no meu ponto de vista. Essa é uma questão que vários headhunters, empresas de RH e mesmo os RH das empresas de tecnologia se perguntam: como é que eu faço para atrair bons programadores, que sejam talentosos, para trabalhar aqui na empresa? A gente vai falar bastante sobre a questão comportamental e deixar a parte técnica do negócio um pouco de lado. Eu não estou falando que testar a parte técnica não seja importante, mas vocês vão entender o que eu quero dizer.

Paixão

O primeiro ponto que eu avalio quando vou contratar um programador é: quanta paixão ele tem pela tecnologia, pelo que ele está fazendo de fato? E por que essa informação é muito importante? Porque programador que está no negócio só pelo dinheiro, por exemplo, é muito difícil de esse cara ser muito bom. Ele pode até ter uma oratória muito boa, mas se ele está muito mais preocupado com quanto ele vai ganhar do que propriamente com que ele vai fazer, isso já é um sinal de alerta muito grande que tem que ser ligado na cabeça de quem está contratando. Então normalmente eu faço essa avaliação eu mesmo, vou lá, marco com a pessoa, troco uma ideia, falo sobre a empresa, quais os desafios que essa pessoa vai enfrentar e vejo a reação dessa pessoa: se ela realmente está interessada no desafio, no aprendizado, ou se ela só quer o dinheiro. Não que dinheiro seja uma coisa ruim, longe disso, mas, honestamente, para mim como programador, o dinheiro fica em segundo plano, porque a gente sabe, principalmente com o mercado aquecido do jeito que está e a falta de profissionais, que ter um bom salário é relativamente fácil. Quando eu comecei, o salário era de R$800,00 e, para época, já era muito dinheiro. Hoje, dependendo da empresa e do local onde você está trabalhando, tem desenvolvedor júnior ganhando na faixa de R$6000,00 e ainda tem a possibilidade de trabalhar para empresas de fora, ganhando em dólar. O salário base de um programador pleno fora do Brasil é coisa de $2500, então é muito dinheiro para uma pessoa jovem, mas é a realidade do mercado atual. Então o dinheiro tem que estar no segundo plano nessa história, tem que ter alguma coisa a mais ali.

Outro ponto que eu acho super importante de todos os RH e headhunters entenderem é que, às vezes colocam uma série de especificações técnicas que a pessoa precisa ter: ela precisa saber da linguagem tal e tal, do Framework X, Y e Z. Hoje eu me interesso muito mais por pessoas que nem sempre tem aquele conhecimento específico, mas tem muita vontade de aprender. Normalmente essas pessoas vão ser mais baratas e vão aprender aquilo que você quer muito rápido. Pelo menos tem sido a tendência com todos os profissionais que eu contratei e que não tinham 100% dos conhecimentos que eu precisava, mas que, em pouco tempo, se desenvolveram e não foi só um caso em que aconteceu isso.

Dar oportunidades para funcionários internos

Mais um ponto que eu acho importante avaliar e que já aconteceu comigo: pessoas que já estão na empresa, exercendo outras funções, e tem interesse de entrar na parte técnica. No Vigia isso aconteceu com dois profissionais, um que era da área de design e outro que era assistente de QA. Essas duas pessoas começaram a programar e pegaram projetos internos nossos. Hoje, um deles foi para IBM e o outro foi para Buscapé. Eram pessoas que estavam com vontade de aprender, eu dei oportunidade e elas se desenvolveram muito bem. Um deles, inclusive, eu considero um dos melhores profissionais com quem eu já trabalhei em todos esses anos e ainda temos contato, somos amigos, por mais que ele não trabalhe mais junto comigo.

Por outro lado, numa situação que eu passei recentemente, eu contratei um programador que era extremamente talentoso, fora da curva, deve estar no top 3 dos caras mais talentosos e inteligentes que eu já conheci. Entretanto, apesar de ser um programador excepcional, era uma pessoa extremamente instável psicologicamente e isso criou uma série de problemas dentro da empresa, por que chegou um determinado momento que não dava mais confiar na pessoa. A pessoa some, aparece quando quer, pode até entregar as coisas que são demandadas, mas se ela começa a não colaborar com o entendimento macro da empresa e começa a tirar conclusões próprias de que as coisas não estão caminhando da forma como ela quer, ela começa a se desmotivar, a fazer outras coisas em paralelo e isso é um problema muito sério, principalmente quando ela está numa posição vital para o funcionamento da empresa.

Isso precisa ser muito bem avaliado na hora da contratação, se essa pessoa tem um perfil estável. Hoje é priorizo muito mais a estabilidade emocional do que o talento, porque na pessoa que é estável você pode confiar. Você pode passar tarefas e ela pode até demorar um pouco mais para entregar as coisas, mas, pelo menos, você tem confiança de que ela vai te entregar. Agora, quando as pessoas são muito talentosas, inteligentes, mas altamente instáveis, você não tem confiança naquele profissional, então acaba que, com o tempo, você vai tirando ela de tarefas que são vitais para a empresa, porque você não pode contar com elas em longo prazo.

Dar prioridade para funcionários mais disciplinados

Eu classifico desenvolvedores em dois perfis claros, que normalmente são os perfis que eu trabalho dentro das minhas empresas: você tem profissionais que talvez não sejam tão talentosos assim, mas que são pessoas que cumprem o que você pede para elas, são aquelas pessoas mais operacionais, que normalmente ficam no cantinho delas, mas entregam todas as demandas, no tempo certo. Mas, normalmente, essas pessoas também são aquelas que não trabalham além do que precisam. Deu 6h, sai do Discord e você só vai ver ela no dia seguinte, quando chega final de semana, ela desaparece. Não tem nenhum problema, essas pessoas também são importantes no processo, porque são aquelas que você sabe que, na data que foi estipulada, vão te entregar a demanda.

Por outro lado, nós temos o perfil de programador que é mais inovador, que quer dar opinião, que quer participar do processo. Normalmente essas pessoas têm um perfil muito mais instável de lidar. Se você opta por pessoas que têm um currículo melhor, que são altamente comunicativas, inovadoras e tal, você corre esse risco de problema de relacionamento interno, principalmente muito ego, que rola nas empresas de uma forma geral, de um programador se sentir melhor que os outros. Esse tipo de perfil precisa ser trabalhado com muito cuidado.

E quem cuida desses devs?

E aí, um ponto que eu levanto é: quem vai gerenciar esses caras? Quem vai gerenciar esses programadores? Uma coisa que as empresas ainda não entenderam e precisam entender é que programadores bons só respeitam outros programadores bons. Se você é diretor de uma empresa e quer dar pitaco no software, mas você não tem o mínimo de conhecimento, você vai ser piada no meio dos desenvolvedores. Então, recado bem caro para os diretores de empresa: fiquem nas suas áreas! Deixe o CTO tomar conta dos desenvolvedores, porque muito provavelmente você não tem competência para querer dar pitaco em como as coisas precisam ser feitas. Eu já vi casos absurdos, em que o diretor comercial veio passar demanda para os programadores, sem entender porra nenhuma do que estava falando, mas queria daquele jeito, de tal cor, com tal botão… Entendia porra nenhum, era só para dar pitaco, para se sentir importante. E acaba que as pessoas vão fazer, porque é o diretor, como se fosse grande coisa. Galera, normalmente diretor é um funcionário como qualquer outro, que pode ser demitido como qualquer outro. Então, se você é programador e está trabalhando numa empresa e vem alguém te encher o saco, pedindo coisas que você sabe que não fazem o mínimo sentido, chegue pro seu gestor e peça para ele fazer uma barreira, para ninguém ficar te incomodando. Normalmente eu blindo todas as minhas equipes, quer pedir alguma coisa, vai pedir para mim, nenhum diretor vai chegar na minha área para dar pitaco, para ficar demandando dos meus funcionários o que ele não entende. É assim que as coisas têm que funcionar, se não for assim, simplesmente você não vai reter bons profissionais, eles vão pedir demissão mais cedo ou mais tarde.

Esse post foi baseado no vídeo que vou deixar linkado abaixo: