Hoje eu vou falar por que motivos eu não confio em Proof of Stake (PoS) e Proof of History (PoH). Como tem muita gente fazendo perguntas sobre o Ethereum 2.0, o que muda e o que pode acontecer no futuro, eu acho que é importante explicar sobre essas tecnologias, suas vantagens e, principalmente, suas fraquezas. Mas, antes de falar sobre PoS e PoH, eu preciso falar do Proof of Work (PoW).

Proof of Work (PoW)

O Bitcoin, que foi a primeira moeda descentralizada, em seu paper originário fala sobre o conceito de PoW ou “prova de trabalho”, para que fosse possível criar uma descentralização do serviço. PoW nada mais é do que máquinas espalhadas pelo mundo inteiro, “computadores” que fazem a mineração desse ativo. Quando mais nós validadores foram entrando na rede, mais a dificuldade foi aumentando e, consequentemente, surgiram hardwares específicos para a mineração do Bitcoin. Hoje, no meu ponto de vista, o Bitcoin é a única moeda realmente 100% descentralizada. Por que o Bitcoin é diferente das outras altcoins? Primeiro que a rede não possui um nó específico para fazer a geração dos blocos, ela é delegada automaticamente entre os full nodes, caso algum full node saia da rede, outro assume e essa autoridade vai sendo passado de um node para outro a cada novo bloco. Segunda coisa, o código: Como nós não sabemos quem é o Satoshi Nakamoto, existe um grupo, uma governança dentro do Bitcoin, para conduzir as alterações. Para gerar uma nova modificação dentro do core da rede, você precisa que a maior parte da comunidade aceite essa alteração. Nós temos casos em que não houve consenso e isso gerou um hard fork da rede, de onde se originaram o Bitcoin Cash, o Bitcoin Gold, o Litecoin, e vários outros derivados da rede do Bitcoin, que optaram por não seguir as implementações que estavam sendo programadas para a rede. Outra escolha muito sábia foi a não implementação de Smart Contracts dentro da rede Bitcoin, eliminando dezenas de possíveis falhas de segurança que podem acontecer. Outro ponto relevante com relação aos Smart Contracts é que, quanto mais aumenta a demanda de outros serviços dentro da rede que não sejam propriamente transferências, acaba gerando uma necessidade de escalabilidade [mas eu falo melhor sobre isso no post do Ethereum 2.0 e por que ele está tomando essa posição de virar stake, de ter shards e rollups]. Quando a gente vê o Bitcoin priorizando segurança e descentralização e deixando um pouco de lado a questão da escala, a gente consegue entender que o projeto realmente é focado em ser independente, não ter centralização de forma alguma e ter robustez. E, pra mim, o ponto mais relevante de todos, e que o Bitcoin é praticamente o único que tem essa regra fundamental, esse pilar, é que existe uma quantidade máxima de moedas a serem expedidas, é uma moeda não inflacionária, e tem isso escrito em seu código original.

O Ethereum, por outro lado, pode criar infinitas moedas, por mais que precise de consenso da governança. A moeda inflaciona, chegando ao ponto do Vitalik Buterin ter sugerido uma alteração, que foi aprovada ano passado, para queimar parcialmente os ganhos dos mineradores, porque o excesso de Ethereum estava sendo prejudicial à rede, deixando os custos da operação muito altos. Hoje os mineradores ganham menos Ethereum na mineração porque parte desses lucros está sendo queimado, sendo jogados para uma carteira no limbo. Uma coisa a se entender sobre o Ethereum em específico, é que ele começou com um propósito muito diferente do que o Bitcoin. O Ethereum não nasceu para ser um método de pagamento, o foco sempre foi criar pequenos programas dentro da blockchain através dos Smart Contracts e quem teve a oportunidade de ler o paper original do Vitalik Buterin, que eu recomendo a leitura, vai perceber que esse conceito é assim desde o início, muito antes do Ethereum de fato funcionar. Com esse conceito, a agilidade nas transferências e o volume de transações que a rede precisa suportar são muito maiores do que se estivesse realizando uma operação simples de transferência de saldo, que é o que o Bitcoin faz. O Bitcoin consegue ter uma dinâmica relativamente rápida, o intervalo de 10 minutos para a geração de um novo bloco é intencional, o tamanho máximo do bloco, os halvings [halving é o processo de redução da taxa em que novas unidades de criptomoeda são geradas, refere-se aos eventos periódicos que diminuem as recompensas por bloco fornecidas aos mineradores] são todos programados. Quem se aprofundou um pouco no estudo do Bitcoin sabe que, daqui 10 anos, o Bitcoin vai estar praticamente a mesma coisa que hoje, já o Ethereum está se tornando uma coisa completamente diferente. O Ethereum surgiu pra ser muito diferente do Bitcoin, mas utilizando os mesmo conceitos de blockchain e de PoW. A infraestrutura do Bitcoin não funciona para serviços baseados em Smart Contracts porque as taxas crescem à medida que mais transações vão sendo realizadas e criar apps dentro dessas blockchains, criar um NFT, transferir, manipular contratos, exigem operações de transaction, que vão ser cobradas da mesma forma que uma transferência de ativo. E esse processamento é mais pesado do que simplesmente fazer uma consolidação, a gente precisa ter máquinas virtuais para carregar o programa, processar, consolidar num storage separado, enfim, é um processo muito mais complexo. Sendo assim, a opção que o Vitalik sugeriu para a comunidade [e a comunidade segue cegamente o que ele fala nesse sentido], é de mudar o PoW originário do Ethereum para o PoS, o que pode fazer sentido pro projeto , mas que me desestimula e desmotiva a continuar a trabalhar no ecossistema  Ethereum.

Proof of Stake (PoS)

Se a gente for olhar como funciona o PoS, nós estamos falando o seguinte: pessoas no mundo inteiro que acumularam Ethereum durante anos vão colocar essas moedas em stake, que é como se fosse uma poupança. Na prática é basicamente isso, você coloca o dinheiro parado numa Exchange ou parado dentro de uma pool de liquidez e eles vão ser os nodes de validação da rede. Perceba, nós vamos eliminar o fator mineração, que é 100% descentralizado, algorítmico e anônimo, para centralizar essa validação em muito menos nós. Por mais que o algoritmo possa ser tão seguro quanto o de PoW, tem uma coisa que me deixa mais com a pulga atrás da orelha nessa história toda. Nós estamos falando de um processo que, anteriormente, exigia um custo energético altíssimo [se você já teve a curiosidade de ver como funciona um DataCenter de mineração, são milhares e milhares, até milhões de computadores realizando processos 24h por dia], você precisa estar perto de uma fonte de energia barata para conseguir manter essa operação e, quanto maior sua operação, mais energia gasta, essas máquinas precisam de manutenção frequente, precisam ser repostas de tempos em tempos, porque elas vão se tornando obsoletas, então existe um custo efetivo da operação; Nenhum governo do mundo conseguiria fazer uma operação que viesse a ferrar toda a operação de mineração. A China era (ainda é) a maior ponta de nodes de mineração do mundo, quando ela proibiu a mineração, mostrou que, por mais poder computacional que se tenha, ainda não representa mais de 50% da rede, então nem lá é possível centralizar e controlar a rede do Bitcoin, do Ethereum, ou qualquer outra rede PoW. Já quando a gente está falando de PoS, é uma questão monetária de ter criptomoedas paradas dentro de uma carteira. Não tem mais o custo de manutenção e de energia, é simplesmente comprar grandes quantidades de moedas e deixar elas paradas. Isso me preocupa profundamente, se um governo qualquer decidir que quer controlar os full nodes do Ethereum, por qualquer motivo que seja, ele só precisa movimentar alguns bilhões de dólares e comprar 51% da rede. Olha como isso é perigoso. E, pra piorar essa situação, se a gente for falar de EUA, que pode imprimir dólares à vontade, isso é mais fácil ainda de acontecer, mas nada impede que China, Rússia, ou qualquer outro regime totalitário possa fazer o mesmo. Vejam os problemas que a gente está trazendo para dentro da rede do Ethereum, onde está a maior parte dos sistemas de DeFi e de stake do mundo, sendo controlada por um Estado. Essa hipótese é remota demais para ser considerada? Caso isso acontecesse, o mercado iria ver esse movimento e tomar alguma posição? Não sei… Qual seria a posição da comunidade? Fazer um hard fork e mesclar com outro projeto? Qual seria? Não sei, entendeu. E ainda temos outro problema se essa movimentação for dos próprios EUA: não sei se você lembram, mas quem compro o GitHub foi a Microsoft, que é uma empresa americana, então até bloquear o acesso ao projeto do Ethereum no GitHub é possível de ser feito. O controle da rede pode acontece e é um risco de segurança à rede do Ethereum migrar 100% para o stake, por mais que pareça teoria da conspiração.

Proof of History (PoH)

E o que é o tal do Proof of History, que é a “super inovação” da rede Solana? O PoH é um PoS um pouquinho mais vagabundo, porque, em vez de você ter a necessidade de colocar as moedas em stake, a rede Solana arbitrariamente seleciona alguém dentro da rede para se tornar o nó validador e ele permanece por uma rodada de validações, a quantidade de validações é uma decisão da equipe. O que a gente viu há pouco tempo foi a Solana sendo pausada após ficar meio maluca, e os desenvolvedores voltando os registros da rede a um ponto anterior ao problema. Olha só o nível de poder que esses desenvolvedores têm, eles conseguem pausar a rede e voltar, e não foi só a Solana que fez isso, o Ethereum também já teve um caso similar no passado onde o The DAO, que era um projeto de fundo de investimentos baseado em Smart Contracts, foi roubado e a comunidade, encabeçada pelo Vitalik Buterin, decidiu dar um rollback na rede [eu vou deixar os posts onde eu falo mais sobre isso linkados no final]; por mais que a rede pareça descentralizada, o poder e a influencia que o Vitalik exerce, convenceu o restante dos desenvolvedores a fazer um reset da rede para poder proteger da invasão e ainda continuar falando que a rede é segura, descentralizada. O Ethereum Classic foi justamente o hard fork que aconteceu da parte da comunidade que não aceitou esse tipo de postura do Vitalik. A Solana fez algo parecido, teoricamente ela recebeu um ataque DDoS que fez com que a seleção do nó validador ficasse desordenada, parte da rede começou a entender o nó como uma carteira específica, outra parte da rede começou a entender o validador como outra, e isso gerou um fork na rede, uma bifurcação, e a rede não conseguiu se reestruturar. Aí os desenvolvedores tomaram a decisão de pausar a rede, eu não cheguei a olhar a fundo como eles fizeram isso, mas eu imagino que exista alguma forma de “desligar” a geração de blocos, não gerando mais blocos, a rede para de funcionar. Os desenvolvedores foram lá, fizeram a alteração no código para apontar qual o fork deveria ser mantido e qual deveria ser deletado e reiniciaram a rede. Percebam, por mais que precise de um consenso dos desenvolvedores para fazer isso, eles ainda têm o poder de conseguir convencer uma rede inteira a parar e dar rollback por causa de falha ou por causa de uma invasão e isso não é descentralizar. No meu ponto de vista é uma centralização disfarçada, não é uma descentralização.

No Bitcoin não existe essa possibilidade, primeiro que a gente não tem um “semideus” controlando a moeda, que pode mandar e desmandar e tem autoridade. Eu acho que até por esse motivo o Satoshi sumiu, ele entendia que se ele se tornasse uma figura como o Vitalik é, sempre existira uma centralização na figura dele. É o mesmo problema que tem com o Linus Torvalds no Linux, por mais que seja uma equipe grande, a autoridade do cara ainda é muito representativa, as pessoas seguem o que ele fala, acham o cara é um gênio infalível. Acho, honestamente, o Vitalik um cara muito inteligente, o que ele fez é muito interessante, não só ele como toda a equipe do Ethereum, mas ele não é mais inteligente que o Satoshi, que entendeu até essa questão de não se tornar um “semideus” dentro do negócio. O Vitalik foi para outro lado, ele gosta da exposição, de todo mundo saber quem ele é, ele gosta de ser o bilionário, o gênio novo, e ter essa popularidade, essa reputação, esse poder. Isso é perigosíssimo. Todo o ecossistema de Smart Contracts, DeFi, stake, que está sendo criado dentro dessa estrutura que um menino de vinte e poucos anos comanda, direta ou indiretamente, pra mim é muito arriscado. Por isso que eu tenho pensado em alternativas de migração de base e estou saindo da minha posição de Ethereum pra que, quando acontecer essa mudança do Ethereum 2.0, eu já esteja alocado em outra plataforma que tenha suporte para Smart Contracts que de fato seja descentralizada e não esteja cometendo os mesmos erros que o Ethereum está. Se você é investidor, minerador ou qualquer tipo de coisa, pode ter a opinião que você quiser. Eu não sou investidor de cripto, já falei isso n vezes, eu sou minerador e desenvolvo aplicações para cripto, o meu papel aqui não é falar se o Ethereum é bom para investir ou não, eu estou falando de quentões técnicas, conceituais. Se eu quero prover um serviço para as minhas aplicações ou para terceiros que tenha segurança e qualidade, não vou colocar em risco todos os projetos que eu faço baseados em uma arquitetura que eu não considere ser confiável. Até hoje eu vi muito potencial na Ethereum, é super interessante tudo que foi criado até agora, porque foi criado em cima da estrutura atual. Eu acredito fortemente que na mudança do Ethereum 2.0 vai ser criado um hard fork, porque tem muita gente que pensa igual a mim e quer manter a infraestrutura que está hoje, porque sabe que é muito mais segura. Tem muita gente que vai perceber isso em longo prazo e vai começar a se desvincular de serviços como o da Solana ou da própria Ethereum 2.0 e vai começar a procurar a segurança que deixaram pra trás na busca de serviços mais rápidos, com taxas menores.

Eu corroboro com o discurso de algumas pessoas que falam o seguinte: se você quer velocidade e usabilidade de forma a competir com os serviços financeiros tradicionais, não tente competir, faça centralizado igual os bancos fazem, porque é muito mais fácil você centralizar, nem  precisa usar blockchain. Usar blockchain simplesmente para poder falar que é inovador? Usar a blockchain da Oracle ou da Amazon pra centralizar suas aplicações ou qualquer coisa do tipo, só vender para o mercado sua aplicação que usa blockchain, mas que de segura não tem nada, eu acho uma sacanagem. Com o tempo, o público vai entender qual a diferença desses tipos de serviços, o que, de fato, é uma descentralização e o que é simplesmente utilizar o termo blockchain para ser cool. Quem entende do mercado e sabe dessa movimentação não acredita nessa história e a tendência, em longo prazo, é que esses projetos de meia pataca evaporem. É por isso que, hoje, a única moeda que eu compro de fato é o Bitcoin, não compro mais altcoins. Eu já brinquei bastante, fiz trade e tudo mais, ganhei e perdi dinheiro, mas eu não considero nenhuma altcoin hoje como reserva e, pra mim, as stablecoins, como o USDC e USDT, são só uma forma de tramitar ou segurar uma parte de portfólio para não ter variação muito brusca, mas, de novo, eu não considero como investimento. Pra mim, criptomoeda é para ser usada, não é para ser guardada. Depois, lá na frente, se a gente tiver a criptomoeda difundida ao ponto de poder usar pra comprar qualquer coisa, aí sim a gente começa a pensar em stake ou qualquer outra coisa do tipo. Até lá, os preços não podem estar tão alavancados como estavam, pra moeda poder se popularizar. Um Bitcoin a 40 mil dólares assusta, tem que fracionar isso pra caramba, o povo pensa muito baseado no conceito da moeda FIAT, você não tem capacidade de comprar 1 Bitcoin inteiro, mas tem 18 casas decimais para trás, enfim, eu deixo essa discussão para outra hora.

Se você concorda ou não com a minha posição com relação a PoS ou PoH, honestamente é uma questão de opinião. Eu estou me baseando em questões técnicas operacionais e principalmente questões mercadológicas, de entender como é que isso funciona e quais são as possibilidades de risco. O PoW foi testado com o tempo, nós temos anos e anos do Bitcoin rodando em PoW e a gente nunca teve caso de um hacker ou de um Estado tentando controlar a rede. Já tiveram várias tentativas, ataques DDoS e tudo mais, e a rede se manteve íntegra e intacta durante todos esses anos. Agora, PoS e PoH são apostas muito complicadas e que estão colocando muitas coisas em risco. Para quem nasce em cima de um protocolo Solana, já está sabendo desses riscos, agora quem está no PoW do Ethereum e está indo pro PoS, entenda muito bem o que eu estou falando aqui, os riscos que vocês estão correndo ao manter suas aplicações e seus ativos dentro de um ecossistema que está mudando e está abrindo mão da segurança em prol da velocidade. A chance de dar algum problema catastrófico irreversível dentro da rede é alta e, por isso, o Ethereum 2.0 já foi adiado várias vezes. O Vitalik sabe dos riscos do que ele está fazendo, ele sabe que uma coisa errada que aconteça vai pulverizar todo o dinheiro que ele tem em Ethereum, a confiança vai acabar, vai acontecer a mesma coisa que aconteceu com o Terra LUNA: perdeu a confiança, acabou. O valor do Ethereum é baseado na confiança, no ecossistema. Hoje o Ethereum é confiável, o Ethereum 2.0 eu não sei e, honestamente, não quero pagar pra ver. Se você quer pagar pra ver…

O conteúdo deste post foi retirado do vídeo “Por que não acredito em Proof Of Stake e Proof Of History”:

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