Continuando aqui a sequência do post “Se sua empresa vive de Ads, a morte está próxima”, se você ainda não leu, lá eu comento um pouco sobre Ads. Eu sugiro que pause a leitura deste aqui e leia , senão corre o risco de ficar perdido nessa história. Agora eu vou focar mais num Ads específico, que é o Ads do YouTube.

Fazendo uma revisão breve do que eu falei anteriormente, a gente teve uma sequência evolucionaria dos sistemas de publicidade na internet, passando dos modelos de banner para os modelos de compra de palavras-chave, CPC, CPM. As métricas utilizadas para otimizar campanha naturalmente também precisaram sofrer uma mudança que, no meu ponto de vista, começou a ganhar força a partir da popularização do YouTube. A gente começou a ter mídias mais próximas ao sistema utilizado nas televisões, com propagandas passando em intervalos nos vídeos, esse tipo de prática é conhecido há muito tempo e o marketing tem uma tendência, quando ele está mudando de ambiente, de tentar reproduzir as técnicas que já são conhecidas e funcionais de outros tipos de plataforma. A internet cresceu muito nos últimos anos, enquanto a televisão tem caído muito, principalmente depois da popularização dos sistemas de streaming, então fazia muito mais sentido gastar numa publicidade dentro do YouTube do que propriamente numa TV, mesmo que aberta, porque o custo de aquisição dentro da TV é muito grande e não tem como metrificar. No YouTube tem como saber o watch time daquela propaganda, quanto tempo a pessoa ficou vendo, se aquele vídeo gerou clique e, ainda, quando essa publicidade está dentro dos dispositivos móveis, pode travar a tela do usuário durante aquele período para não executar nenhuma ação ele terminar o vídeo. As métricas desse tipo de Ads é diferente do que, por exemplo, no CPC e no CPM, tanto as métricas de aquisição quanto de compra dessas campanhas, normalmente você compra tempo de tela e exposição, no CPC e CPM você compra por interação e por quantidade, mas na prática a execução da campanha é muito próxima. Inclusive, dentro do próprio Google Ads você consegue fazer campanhas de vídeo também, no Facebook também (quando eu falo FaceBook, eu estou considerando o Instagram junto, porque dentro das ferramentas de Ads as campanhas podem ser feitas pras duas plataformas).

O que é que o Google, principalmente o YouTube, tem de diferente nessa modalidade de campanhas de AdSense? Anteriormente, o foco da aquisição era baseado em pesquisa, então era uma campanha muito mais direcionada, muito mais específica para um termo de pesquisa em si. Quando a gente faz uma campanha de YouTube, a gente está mais interessado no acumulado de público de determinados canais, por mais que seja possível segmentar a campanha. Eu vejo muita segregação com relação a quais canais o anunciante quer que a propaganda passe, o anúncio não é muito generalista, ele é mais focado em canais que, no entendimento dos setores de marketing, são mais próximos do tipo de target que eles querem alcançar. Normalmente esses canais são um “tiro de canhão”, atingem muitas pessoas, e a gente vai ter um fenômeno que é o marketing de indicação, que, pra mim, é um dos mais poderosos que existe. O marketing de indicação basicamente é uma pessoa indicar para um amigo uma loja ou um produto, normalmente a nossa tendência de consumo é ligada à confiança, então se você confia numa pessoa, tem muito mais chance de escutar o conselho dela na hora de fazer uma compra do que propriamente entrando numa plataforma de comparação ou fazendo uma pesquisa na internet. A gente consegue ver no peso que grupos de FaceBook, de WhatsApp e de Telegram têm com relação ao consumo nos últimos dois anos, eles têm se popularizado e têm uma força muito grande e crescente. Isso evoluiu para o marketing de influência, porque um influenciador, no final do processo, é uma pessoa que, através do seu conteúdo, cria certa empatia com o seu público. Mesmo que o público normalmente não tenha acesso direto a essa pessoa, acredita que o que aquele influenciador está indicando e vendendo é de confiança. Particularmente, como eu entendo os dois lados e convivi com vários influenciadores, existe uma parcela dos influenciadores que de fato segmenta muito qual tipo de propagando vai passar nos seus canais. Eles recebem uma enxurrada de empresas tentando comprar publicidade nos canais e filtram coisas com as quais eles não trabalham ou não confiam. Mas existe uma parcela dos influenciadores que estão mais preocupados com o dinheiro, então eles vão publicar qualquer coisa que seja, e aí a gente vê vários escândalos, de influenciadores tomando busca e apreensão de Polícia Federal, enquadrados em esquema de pirâmide, porque se envolveram na publicidade de produtos que não eram corretos, que visavam tirar dinheiro do consumido. É um limiar muito perigoso.

Foi o YouTube que começou com essa moda de pagar para os influenciadores geraram o conteúdo, é uma prática que, por exemplo, o FaceBook não tem. Durante um bom tempo essa foi uma fonte de receita para esses youtubers, fazendo com que eles conseguissem viver desses Ads e montar empresas em cima disso. Toda a renda extra, publis fechadas fora do YouTube, eram bônus em cima do faturamento do Ads, então sempre o foco principal foram as métricas do YouTube. Os vídeos foram sendo modelados de acordo com as diretrizes da plataforma para ter um alto engajamento, gerando uma grande quantidade de views e um faturamento elevado. Só que essa mecânica tem mudado muito, principalmente depois da entrada do TikTok no mercado de redes sociais. O TikTok tem uma premissa muito diferente do FaceBook ou do Google, ele se preocupa com a propagação e não na monetização. Então o TikTok não paga para nenhum influenciador, mas ele garante que vai entregar todo o conteúdo gerado. O que começou a acontecer no mercado de influenciadores foi que um grupo mais bem estruturado, com nomes que são grandes e que se moldam melhor às diretrizes do YouTube, potencializando seus lucros, tenta privilegiar a plataforma e continua com o discurso de que o YouTube ainda é uma excelente forma de você ganhar grana. Mas há uma migração em massa de influenciadores de médio e pequeno porte para outras plataformas, que dão melhores condições de propagação de conteúdo. Veja, se você é um criador de conteúdo e depende da distribuição do YouTube, você está ferrado, eu vejo influenciadores com 4, 5, 10 milhões de seguidores que não conseguem impactar 1% da sua base, essa galera ficou rendida à forma como o YouTube divulga e propaga seus conteúdos. Os influenciadores fizeram investimento para aumentar as suas equipes e melhorar o nível de qualidade do conteúdo, comprando equipamentos melhores, tendo bons editores, tudo com um custo muito mais elevado do que era há 10 anos. Durante um tempo o impulsionamento dos Ads ajudou esses influenciadores a se estruturaram financeiramente, mas agora está tendo uma queda na receita média. “Ah, mas um cara com 10 milhões de subs não é médio, ele é grande”, mas ele também está sofrendo, a ponto de ter que ir a mercado procurar patrocínios e investidores que antes ele rejeitava, mas ele precisa manter todo esse ecossistema que ele montou na expectativa que o Ads do YouTube permanecesse da forma como tava antes. Isso não aconteceu só no YouTube, aconteceu também na Twitch e em várias outras plataformas.

Outra coisa que eu tenho visto bastante é influenciador criando conteúdo para o TikTok e soltando no YouTube em formato de Shorts. O algoritmo do YouTube sofreu várias alterações recentemente, começou a ter os Shorts para competir com Instagram e TikTok, mas ao mesmo tempo ele também não monetiza o Shorts, então os influenciadores mais antigos não estão privilegiando fazer Shorts. Por outro lado, os Shorts geram mais engajamento, o telespectador está querendo conteúdos curtos. Ao mesmo tempo, nós tivemos o advento dos Podcasts, que são vídeos de várias horas, que têm uma quantidade de visualizações absurda também. Esses canais de Podcast são impulsionados pelos cortes, que são propagados ao longo dos meses e geram interesse para o vídeo completo. Aí a gente precisa entender um pouco a cabeça do YouTube: ele está preocupado com quanta publicidade vai poder passar ao longo de um vídeo, ele quer passar cada vez mais publicidades, mas também não pode ser uma quantidade absurda igual a Twitch tem feito, por exemplo, que a cada 10 minutos vem uma publi. Os influenciadores maiores geralmente seguem num modelo específico de fazer vídeos de mais ou menos 10 minutos, esperando entrar no “em alta” e nos “sugeridos”. Ao mesmo tempo, existem outras métricas sendo alteradas e testadas pelo YouTube, para não perder campo para o TikTok. Eu estava vendo uma entrevista recente do Kondzilla com o Joel Jota, em que ele fala que o YouTube privilegia muito mais as playlists do que os vídeos avulsos, então se o seu vídeo cai numa série de playlists, ele vai ter maior propagação e engajamento do que se você só estiver no “em alta”. Tem várias outras métricas internas que não ficam bem claras para quem está gerando conteúdo, como, por exemplo, o parâmetro de watch time. Alguns influenciadores falam que a métrica mais importante para o criador de conteúdo é o tempo relativo do vídeo que o usuário está vendo: Se eu faço um vídeo de 10 minutos, e ele assiste 2 minutos, meu watch time está baixo; agora, se eu estou fazendo um vídeo de 10 minutos e as pessoas estão ficando em media 8 minutos vendo o vídeo, meu watch time está legal. O YouTube leva isso em consideração ao fazer a propagação interna nos “sugeridos” e no “em alta”. Então a gente vê que a distância entre o entendimento do criador de conteúdo e o que o público de fato tem consumido tem se distanciado, porque o YouTube prioriza o que for melhor em termos de venda de publicidade, mas isso não está acompanhando diretamente o perfil do consumidor final, do viewer. Esse sinal está bem claro, a ponto de o TikTok estar disparando na frente do YouTube em questão de visualizações, engajamento  e público no geral. E percebam, o modelo de monetização que o TikTok tem é, no meu ponto de vista, baseado em coleta de dados, ele monta um profile com essas informações que, hoje, são riquíssimas. O tempo de tela que o TikTok tem é muito alto, se comparado com todas as outras redes sociais que a gente tem hoje no mercado, e têm surgido pessoas gigantescas no TikTok, como é o caso do Luva de Pedreiro, que tem muito pouco engajamento dentro do YouTube. O YouTube está tentando se adaptar, mas, ao mesmo tempo, ele tem sofrido bastante com isso.

Fazendo uma ponte entre o que a gente estava falando de custo de aquisição, investimento em marketing, compra de Ads e tudo mais, como é que isso está impactando diretamente no influenciador médio (eu honestamente acho que isso tem afetado todos os tamanhos de influenciador)? Vamos fazer um pequeno raciocínio: Se a gente está falando que o CAC aumentou, a liquidez do mercado caiu e está tendo menos investimento de risco, você tem menos investimento em marketing consequentemente. A métrica de aquisição mudou, muito anunciante está tendo que se preocupar com LTV [Lifetime Value] da empresa e não com o CAC, que está impagável. Adquirir usuários no varejo está muito caro, então você tem que começar a trabalhar o CRM interno e o BI para poder aumentar a recorrência dentro do seu serviço. Consequentemente o marketing de influência, principalmente de grandes influenciadores, que tem um custo muito elevado e não tem uma métrica muito sólida, nem o ROI não é tão positivo assim, começa a ficar em segundo plano. O Ads do YouTube tem caído muito, mas muito mesmo, está 1 décimo do que estava há 1 ou 2 anos atrás. Isso eu estou falando baseado em números, eu estou levando em consideração a analise de canais de grandes influenciadores que eu tenho acesso, por exemplo, do meu sócio, Douglas [Rato Borrachudo]. Eu tenho acesso e vi que a rentabilidade de Ads do canal dele, de 2 anos para cá, caiu de uma forma absurda, mesmo mantendo a quantidade média de visualizações. Existe uma série de questões envolvidas nesse processo e, no meu entendimento, é justamente pela falta de investimento de marcas nesse tipo de publicidade: O ROI não está positivo e o CAC do Ads de uma forma geral está muito ruim, não está fechando a conta, a empresa queima caixa sem ter certeza que esse dinheiro vai voltar como lucro no final do trimestre.

E aí a gente começa a entender por que o varejo (e vários outros segmentos) teve uma sequência de resultados negativos no último ano, com uma queda média de 80% nas ações das varejistas, como Via Varejo, Magalu e B2W. Levar resultados negativos ao mercado cria mais pânico, mais preocupação, então é necessário potencializar ou, pelo menos, zerar essa conta. É muito melhor trazer um resultado zerado do que negativo, principalmente com a escassez de investimentos, então cortam tudo que não está gerando ROI positivo. Obviamente existem segmentos específicos, como é o caso, por exemplo, de moda, de pets, de lifestyle, cujo ticket médio é mais alto e a recorrência é maior, em que essa conta ainda fecha, mas quando a gente fala de varejo generalista essa conta não fecha e os investimentos secam. Os influenciadores de médio e pequeno porte estão parando de produzir conteúdo para o YouTube porque o Ads gerado não paga as contas daquele esforço, e aí muita gente está preferindo voltar para o mercado de trabalho convencional a continuar nessa empreitada de fazer lives e fazer vídeos para o YouTube. Só quem está sobrevivendo a essa fase do mercado são as empresas e os influenciadores mais bem estruturados, que já têm um público mais fidelizado, e todos eles, sem exceção, estão procurando formas alternativas de receita, seja com patrocínios, publis ou criação de produtos. Está uma onda de lojas e produtos de canais, vendendo camisetas, canecas, clube de assinantes, conteúdos exclusivos, tudo para tentar tapar essa sangria que o YouTube está causando. Isso é muito perigoso, a gente está fadado a talvez, daqui alguns anos, só ter os criadores de conteúdo que hoje têm estrutura financeira para conseguir aguentar essa porrada, ou empresas que tenham capacidade de geração de caixa sem precisar do Ads do YouTube. Todo o conteúdo desses pequenos e médios criadores vai ser pulverizando e sumindo ao longo do tempo. Outro dia eu vi um tweet do Felipe Neto perguntando por onde anda a galera que produzia conteúdo, meio que dando uma chamada para eles voltarem a fazer conteúdo para o YouTube. Eu conheço vários influenciadores pequenos e médios e eles realmente estão cogitando a possibilidade de focar somente em outras plataformas, porque o resultado de propagação os permite fechar melhores patrocínios e publis para os canais, e deixar de lado a criação de conteúdo do YouTube, que dá trabalho, demanda tempo, demanda investimento e não está mais pagando a conta. É uma mudança drástica no modelo que a gente está acostumado, o marketing de influencia está perdendo a força, tem aparecido no mercado publicidades com marcas que, no meu ponto de vista, são duvidosas, cassinos, apostas esportivas, é o tipo de coisa que eu particularmente não aceitaria ter qualquer tipo de vínculo. Eles entram numa zona cinzenta da legislação para ter exposição e se eu fosse um youtuber grande, iria pensar 10 vezes antes de fazer a divulgação de alguma coisa desse tipo, porque há a possibilidade de dar problema, como já deu para alguns influenciadores, como o Tirulipa. A gente sempre tem que analisar essa razão entre risco e retorno, dinheiro no bolso é bom, mas o problema que isso pode causar lá na frente é muito grande e pode gerar muita dor de cabeça, e eu prefiro muito mais não ter dor de cabeça.

Vou deixar aqui a indicação de leitura para quem estiver interessado em entender mais sobre o que tem acontecido com o mercado atual:

O conteúdo deste post foi retirado do vídeo “Reflexo do aumento do CAC para influenciadores”: